sexta-feira, 14 de maio de 2010

Choro


Choro, grito e angústia. Eu caminhava por entre os sobreviventes raros de mais uma catástrofe provocada pela soma de ação humana e força da natureza. O resultado não poderia ser diferente. Muitos mortos, mais desaparecidos ainda. Por uma coisa simples, comum e bela. Chuva.
Chovia muito, e os repórteres nos cercavam, querendo números, estatísticas, imagens e o que mais pudessem pôr as mãos.
Eu só queria ajudar um pouco mais, amenizar a dor de mais famílias.
Consegui sentir o choro apertar a garganta, me fazendo lembrar da minha chuva interna. Lembrei-me do primeiro corpo que retirei dos escombros. Lembrava-me do corpinho gélido de criança nos meus braços. Da falta de vida naquele rosto.
Chorava. Chorei por não saber mais o que fazer.
Por não poder devolver a vida. Continuei o trabalho, mesmo com lágrimas nos olhos. Precisava continuar, e com sorte, salvar alguma vida. A cada segundo que se passava, aquilo me parecia ainda mais improvável.
Mais corpos e muito menos vida naquele ambiente sujo, impróprio. Corpos inanimados. Mortos. Sem vida.
As máquinas trabalhavam sem cessar, não paravam. A chuva continuava. Atrapalhava. E eu continuava a chorar. Meu choro atrapalhava tanto quanto a chuva.
Minhas lágrimas caíam sobre os corpos que eu carregava. Molharam minhas roupas enquanto me trocava para voltar pra casa, depois de um dia exaustivo. Molhou o carro, as chaves, o banco do motorista.
Minha vida foi regada pela chuva, pelas lágrimas e pelas tragédias daquele dia tortuoso.

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